Nos últimos dias, um novo produto tem chamado a atenção dos consumidores e especialistas do setor alimentício: o “cafake”, um pó para preparo de bebida à base de café vendido em embalagem semelhante à dos tradicionais pacotes de café. O produto, que viralizou nas redes sociais, não tem registro da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para comercialização e representa um caso extremo da crescente tendência de produtos que se assemelham aos originais, mas possuem qualidade inferior.
O que é o “cafake”?
De acordo com Celírio Inácio da Silva, diretor da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), o café autêntico é um monoproduto extraído do grão do café, que passa por um processo de secagem e beneficiamento. Já o “cafake” contém impurezas como cascas, mucilagem, pau, pedra e palha, ou seja, componentes que não deveriam fazer parte do produto.
O pó para bebida sabor café tem sido encontrado em supermercados com um preço significativamente menor: meio quilo do produto custa cerca de R$ 13,99, enquanto o café convencional tem um preço médio de quase R$ 30. Esse preço atrativo tem feito com que muitos consumidores adquiram o produto sem perceber que estão comprando algo diferente do café tradicional.
Produtos que ‘parecem, mas não são’ e a influência da inflação
A proliferação de produtos similares aos tradicionais se intensifica em momentos de aumento da inflação, como o atual. O café foi um dos itens que mais encareceram em 2024, com alta de 39,6%, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), enquanto a inflação geral foi de 4,83%.
A estratégia das famílias de baixa renda para lidar com esse aumento de preços muitas vezes é substituir produtos tradicionais por similares mais baratos, que, apesar da aparência, possuem composição diferente e qualidade inferior. O fenômeno também pode ser observado em outros produtos como:
- Bebida láctea, que é um similar ao iogurte;
- Óleo composto, mistura de azeite com outros óleos vegetais;
- Creme culinário, alternativa ao creme de leite;
- Composto lácteo, similar ao leite em pó.
Esses produtos são permitidos por lei, desde que informem claramente em suas embalagens que não são equivalentes aos produtos tradicionais, o que nem sempre acontece.
A polêmica envolvendo a substituição de produtos
O debate sobre os produtos similares se intensificou após uma declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sugerindo que os consumidores evitassem comprar itens com preços elevados e buscassem alternativas mais baratas. Segundo Lula, essa atitude faria com que os comerciantes reduzissem os preços dos produtos mais caros para conseguir vendê-los.
Contudo, especialistas alertam que a substituição indiscriminada pode levar ao consumo de itens de menor qualidade nutricional, muitas vezes ultraprocessados, ricos em gorduras, sal e açúcar, prejudicando a saúde da população.
Indústria e rotulagem: como evitar enganos?
Um dos maiores desafios para o consumidor é identificar os produtos similares nas prateleiras dos supermercados. Muitas vezes, as embalagens são propositalmente semelhantes aos produtos tradicionais, dificultando a diferenciação.
Mariana Ribeiro, nutricionista do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), destaca que é essencial analisar a denominação de venda e a lista de ingredientes. “No caso do ‘cafake’, mesmo que ele tivesse registro, a maneira como ele é apresentado ao consumidor pode induzir ao erro”, explica.
Outro ponto preocupante é a presença de ingredientes fantasmas nos produtos, ou seja, elementos mencionados na embalagem, mas ausentes na composição. Casos notórios incluem:
- Creme de avelã sem avelã, feito apenas com cacau e aromatizante;
- Biscoito “fitness” de aveia e mel sem mel, contendo apenas aromatizante.
Essas práticas geram indignação, especialmente quando os produtos são promovidos como saudáveis.
Os impactos para a saúde
O consumo de produtos similares não é, por si só, prejudicial à saúde, mas a qualidade nutricional pode ser inferior. Produtos à base de soro de leite, gordura vegetal e amido modificado possuem menor teor de nutrientes do que os tradicionais.
A preocupação maior recai sobre os ultraprocessados, que contêm corantes, aromatizantes e edulcorantes. O alto consumo desses produtos está associado a obesidade, doenças cardiovasculares e diabetes.
Para evitar armadilhas, a dica é sempre ler atentamente os rótulos e desconfiar de preços muito abaixo da média de mercado. Em tempos de inflação, a busca por alternativas mais baratas é compreensível, mas estar atento ao que se está consumindo é essencial para a saúde e o bem-estar.